Diz o dito popular que o criminoso sempre volta à cena do
crime. Nesse caso, o crime foi perfeito.
Muita gente curte historias fetichistas outros nem tanto.
Porque é complicado escrever sobre algo real e conseguir passar a impressão de
que o fato realmente existiu. E esse aqui não chegou por email ou apareceu
através de um papo fetichista numa mesa de bar no meio da madrugada. Ele vem lá
dos meus arquivos de memória.
Foi mais ou menos assim.
Não é muito a minha praia dar uma de cupido. Esse negócio
de apresentar fulano a beltrana soa a forçação de barra e intromissão. As
pessoas se acham por meio de vários detalhes que irão compor um todo e se
aproximam. Mas faz um tempo, meio que por acaso, entrei numa.
Uma amiga tinha insight de dominatrix. Estava na veia e
toda vez que o papo era fetiche mordia os lábios diante de uma cena onde uma
mulher mantinha outra em servidão.
Era lésbica de berço, aliás, muitas amigas dominadoras o são.
Nada a estranhar.
Naquela época a vida era rodeada de boas play-parties.
Acho que toda a saudade que o fetichismo me causa está nessas plays. Nada é tão
intimista como o confronto face to face.
Aquele cheiro de couro misturado com o odor das velas
ardendo com um som underground no fundo remonta um quadro. E essa pintura
estampa essa amiga alta e muito magra com um olhar profundo e direto. Talvez
meu respeito por suas taras a trouxessem ao meu convívio, ou quem sabe, tenha
ido com a minha cara, vai saber...
E numa dessas festas no bairro de Moema em Sampa rolou
uma troca de olhares e, por uma feliz coincidência, eu estava no centro do
conluio. O alvo era uma masoca nova no pedaço com quem já havia trocado algumas
referências. Senti o açodamento em segundos. Havia o flerte.
Claro que não sabia se do lado de lá existia a
homossexualidade pulsante. Minha ligação com a domme era bem mais estreita e
permanente, enquanto que do lado de lá apenas umas parcas conversas num antigo
chat fechado por senha num provedor de internet chamado Mandic.
Tempos idos.
Entretanto havia uma chance. E não existia local melhor
que uma bela play-partie cheia de gente autentica e decente pra os pólos
tomarem seus lugares no contexto. Empurrei a pedra.
Deixei-as posicionadas no tabuleiro e bati em retirada.
Naquele jogo eu não era mais o coringa, pois havia cumprido a minha parte. Mas
lá pras tantas, minha amiga me puxou pelo braço e cochichou que ousaria tentar
uma cena com a moça masoca. Perfeito – disse – quem não iria gostar de ver? A conspiração
era farta e a audiência garantida.
No entanto, ela queria algo parecido com uma fotografia
que eu lhe havia passado por email.
Certo que havia pirado com a tal sugestão fotográfica de
um antigo site que já bateu as botas.
Só que a masoca era gordinha, aliás, demais até, e não ficaria
em sintonia com a imagem já que deveria ser bem magrela pra dar liga. Mas mesmo
assim ela insistiu. Que jeito!
Lá fui eu catar um pedaço de sisal e cumprir com minha
sina de “fantasy maker”. Porém, criar uma cena com uma gordinha em strappado
(mãos atadas nas costas e presas em suspenso), é tão complicado quanto um
destro escrever com a canhota. Fiz o melhor que pude.
E rolou a cena. A galera parou e viu uma mulher expondo
seu lado domme junto a uma masoca em pleno exercício do prazer através da dor.
Voaram alto.
Fiquei observando e imaginando quantas batidas daqueles corações
pulsavam. Me senti privilegiado por fazer parte da felicidade alheia, não por vocação,
mais por uma incrível coincidência de estar na hora certa e no lugar certo.
Depois disso acompanhei a distância. Problemas
conjunturais do BDSM causaram uma ruptura momentânea depois desses eventos, um
fato que tem a ver com outra história que algum dia eu tiro dos meus arquivos e
posto por aqui.
Meus dias de cupido terminaram e o acaso não me trouxe
outras possibilidades iguais.
Talvez um dia alguém me cante a pedra e eu receba um empurrão
desses em reciprocidade.
É... Quem sabe?
Um comentário:
Pois então... Quem sabe? Beijos...
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