sexta-feira, 28 de junho de 2013

Entre “Ser” ou “Não Ser”


Noutro dia alguém me argüiu sobre fetichismo.
Até então tudo certo. Porque ter fetiche por algum objeto é tão normal quanto à coleção de sapatos da Duquesa de Wellington. Afinal, fetiche vem do português feitiço e a palavra foi aperfeiçoada e seu conceito burilado pelos franceses. Tudo que enfeitiçava virava um vício.
Mas no nosso caso fetiche tem a ver com sexualidade.
Ter fetiche por determinadas práticas sexuais envolve algumas particularidades. Porque quando algumas dessas práticas tornam-se necessárias e, por sua vez, repetitivas, apregoa-se a palavra fetichismo o ato de praticar. Nesse caso, BDSM passa a ser apenas uma sigla representativa que de certa forma não engloba todos os fetiches que se tem notícia. Porém, ela agrega e aproxima conceitos e pessoas.
Evidente que pra quem chega vale o experimento. A novidade fascina, aguça e às vezes tira a pessoa dos trilhos, literalmente. Noves fora em que parte da mesa o jogador se encaixa melhor no torneio, ele terá que decidir uma questão bem simples: ser ou não ser.
O fetichismo é permissivo e atraente. Muita gente com a auto-estima em baixa emerge para uma nova vida captando as boas vibrações que ele produz. A mulher antes comum se torna a rainha nas redes sociais exibindo seus pés como dote aos súditos que se multiplicam imaginando as cenas que elas criam. E se aperfeiçoam.
No entanto, para que essa escolha se torne efetiva há que sair da tela e viver o papel principal.
Aprendendo, tropeçando e tendo coragem de assumir a própria decisão. Porque nem sempre é tão simples deixar a virtualidade pra trás e ser o protagonista da própria história.
Há que colher nas entrelinhas, beber na fonte das boas palavras e absorver detalhes. Sim, o fetichista habita os detalhes e faz deles a sua bandeira. Quem não o faz deixa a escola sem ter a noção da aula e voltará cabisbaixo pra dizer que não conseguiu entender a lição.
Por isso, o fetichismo oferece ao recém chegado dois caminhos: estar fetichista ou ser fetichista. Nada é efêmero; nesse universo a realidade pulsa na medida em que as sensações se transformam e provocam gozos e orgasmos diferentes daqueles que antes se conhecia.
É comum no debate deparar com pessoas que afirmam ser o fetichismo um tipo de cultura que dormia em seus sonhos e despertou através de pesquisas e imagens. O que pode ser a mais pura verdade ou mais doce das desculpas. Entretanto, se esta pessoa se integrar ao tema, abraçar a própria causa e colher os frutos pouco importa como chegou até o fetichismo, desde que saiba onde está e o que quer realmente fazer.
O fetichismo permite todas as escolhas, mas não perdoa erros.
É preciso se posicionar e estabelecer um elo entre pessoas comuns ao pensamento. Desde que conheci esse mundo de forma organizada entendo o fetichismo como integração. De forma participativa é possível a troca de idéias e experiências capazes de levar aos novatos um pouco da garra necessária para quebrar os tabus.
E apenas o tempo será capaz de criar uma lógica na cabeça de quem chega.
Vi muita gente com um discurso perfeito deixar o registro e ir embora. Sempre existe o momento em que há de fato a sucessão. Vejo gente nova e muito competente chegando. Conceitos quase perfeitos e coragem de defender uma causa num lugar onde uma simples forma de pensar diferente se mescla com promiscuidade. Assim foi e assim será.

Então, se você está desembarcando nesta estação seja bem vindo. Repare que não há uma regra comum e sequer um ditador desse conceito. O único dono da verdade é você.
Invente e reinvente a cada dia. Torne-se senhor ou senhora dos seus sonhos e abrace a causa se ela realmente te fizer arrepiar os poros e aumentar os batimentos.
Com certeza absoluta este aqui é o seu lugar...

Um bom final de semana a todos!

terça-feira, 18 de junho de 2013

Novos Ares


Deparei com um artigo hoje que achei interessante.
A lógica diz que ele deveria ser mais profundo. O problema é que as pessoas têm preguiça de pesquisar e acabam generalizando, mas tirando por baixo, o artigo fala que as pessoas as quais praticam sexo excêntrico via-de-regra gozam de boa sanidade mental.
No entanto, sexo excêntrico não engloba apenas o sadomasoquismo como enfoca a matéria. O fetichismo reúne um bom número de jogos capazes de criar emoções das mais diversas que arejam a nossa cuca também.
O que deveria ser frisado pelo autor ou autora quando se refere ao comportamento despojado de quem se atém a esse tipo de prática sexual, é a necessidade básica de deixar a timidez no armário. Tarefa ingrata pra quem chega, mas essencial para trazer continuidade a quem fica.
E essa talvez fosse à razão que os analistas deveriam ter trazido ao assunto. Porque ela além de dar base ao praticante, pode ser muito benéfica em casos de rejeição que ele vai encontrar pelo caminho.
O chamado “quebra gelo” inicial em quem recorre ao fetichismo no intuito de criar uma atmosfera positiva às suas experiências sexuais começa com esse paradigma. Porque não é tão simples como possa parecer ou complicado demais como querem que seja. Entretanto, alguém que se aproxima de pessoas praticantes sente-se um peixe fora d’água num primeiro approach, e, em seguindo o caminho, procura estabelecer um elo com o universo normalmente de maneira que soa até exagerada, haja vista, a forma atabalhoada em que este recém chegado procura abordar os que estão a sua volta na tentativa de mostrar a que veio.
Não é difícil observar este tipo de comportamento nas redes sociais.
E, como disse, basta pesquisar, estar atento e conhecer.
Claro que quando isso é levado ao campo da psicanálise à esfera toma uma proporção mais ampla. A matéria cita o Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais e entra de sola no sadomasoquismo como único exemplo de excentricidade capaz de transformar a visão de quem se dedica a criar fantasias em suas experiências sexuais. Entra em cena a cartilha do analista que trata fetiche como distúrbio psicológico ou transtorno, e pela primeira vez isso é rechaçado por algumas fontes que passaram a perceber a tal cabeça mais livre com a presença de novos ares na vida de quem se dedica a praticar a fantasia.
Aqui se estabelece um dilema.
E deste dilema apareceram pesquisas através de entrevistas com praticantes aonde foi percebido um trato melhor até mesmo com a rejeição quando da apresentação da prática, o que vem corroborar com o que foi dito no começo da nossa conversa quando abordo a timidez como o maior empecilho a quem se aproxima do BDSM.
Não pensem que é simples a uma pessoa recém apresentada ao mundo que sempre manteve trancafiado na imaginação e se declarar de todo. Desnudar sentimentos não é tarefa descomplicada.
A análise conclui, ainda, que quem busca práticas íntimas fora dos padrões considerados normais possui elevados níveis de bem-estar e segurança pessoal dentro dos relacionamentos. Nesta fase eu concordo em todos os níveis. O fetichismo traz segurança uma vez inserido de forma absolutamente correta numa relação.

E isto é notado até mesmo em relações não convencionais, as chamadas relações extraconjugais, uma vez que essa sensação de bem-estar consegue enxergar uma brecha entre o certo e o errado desde que o fetichista saiba conviver com os dois lados de maneira coerente. Mas há que se ter muito cuidado com isso, porque a consciência por uma necessidade em práticas sexuais incomuns pode levar à frustração e menos envolvimentos emocionais.
Em resumo, mais um dilema, dentre tantos que acompanham o fetichista ao longo da vida.
Evidente que o ideal seria que tudo se concentrasse num só lugar e numa só relação, 

mas nem sempre os capítulos são escritos para seguirem uma linha lúdica de racionalidade.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Desconstrução


Tudo parece muito simples até virar realidade.
Quem em sã consciência jamais viveu um conflito? E por que no fetichismo seria diferente?
Nas várias fases que fazem o praticante flertar para logo em seguida abraçar a doutrina e as práticas, requer doses cavalares de análises.
De fato, é preciso desconstruir alguns conceitos e entender outros tantos.
Não é fácil tramitar por esse caminho. Existem sentimentos que se adquire ao longo da existência e fazê-los desaparecer é muito difícil. E estamos falando em posse, ciúme, às vezes religião, o que representa um abismo entre o antes, o durante e até o depois.
Entretanto, como sempre digo por aqui, o BDSM precede de escolhas. Isso é imutável.
Prosseguir num segmento basicamente ligado ao sexo e ao prazer trazendo lições decoradas e aprendidas por muito tempo requer muita reflexão. Talvez o BDSM seja um tipo de conduta social que está imune ao que se costuma chamar de “escapada pra tentar algo diferente”.
Há pessoas, ou até casais, que aparecem em casas de swing pra viver uma fantasia de uma única noite e de lá nem guardam o endereço. Mas o fetichismo, o BDSM, está tatuado na alma de quem ao deparar com os conceitos pressente que a bússola definiu o caminho que ele tanto tempo andou a procura.
Evidente que há escapadas, chegadas e partidas. Ninguém está imune a isso e ao longo de todos esses anos ligados ao assunto já fui testemunha de muita coisa nesse sentido. Mas se houver integração de fato, ou melhor, se os batimentos cardíacos mostrarem uma freqüência acima do normal, a volta é certa.
Pouco importa, nesse caso, as conseqüências, porque algo haverá de ser mais forte.
Então, se alguém por inúmeras razões habita num casamento longe de suas perspectivas haverá de pensar muito antes de dar o primeiro passo. Homens e mulheres, na base dos direitos iguais de perdas e danos. Não pensem que o marmanjo pode brincar na corda bamba com maestria diante do fato de ter que voltar pra casa e viver no vazio. Aqui, onde todas as tochas queimam, o buraco é literalmente mais embaixo. Porque ele mexe com as entranhas e ressuscita sentimentos que emanam de algum lado que a vida ainda não nos deu qualquer explicação.
E como ela pode se entregar a outro homem se no seu casamento ela jurou fidelidade?
Vale a escolha de Sofia. Pra quem não sabe o Dr. Google explica, aqui o espaço é pequeno pra tanto.
E como o sujeito que habita o universo dentro de uma união com alguém consciente do BDSM e a vê em eventos tendo os pés beijados, açoitando outras costas, acariciando e sendo reverenciada como uma rainha?
O ciúme, a posse, necessita ficar guardado a sete chaves ou o caldo entorna.
Resumindo a ópera meus caros, não haverá experiência sem dor ou sem identidade. Óbvio que existe a possibilidade de chegar, ver e não querer nunca mais. Muita coisa é mal conduzida nesse meio. Mas esse papo de esquina ou de final de festa de que vale uma experiência trocada num evento pra medir reação é a historinha mais boboca que já ouvi por aí. É como o cidadão que se diz o fodão mandando mensagens em off as meninas nas redes sociais se fazendo de garoto de programa, ou fantasy maker, se assim preferirem.
BDSM vicia sim e causa dependência.

E não pensem que é um blefe, um delírio. Porque pra quem o sino toca pela primeira vez, a vida não mais será a mesma sem ele. Se houver o efeito contrário, a morte do sentimento é certa e definitiva.
Por isso, escolham bem antes de qualquer tentativa de experimentar se o desejo for muito forte e estiver causando frisson. Mas faça com regras, as suas e as da doutrina. Procure o certo e deixe o duvidoso pra quem já tem discernimento de avaliar. Talvez haja uma troca 

de rumo, pois muitas vezes sentimentos novos aparecem do nada, mas isso só é possível depois que entrar pela porta e trancar a fechadura.

Um bom final de semana a todos!

terça-feira, 4 de junho de 2013

A Porta dos Fundos


Nos tempos idos a onda era comer a empregada do vizinho. Em caso de flagra, a porta dos fundos era a saída mais próxima. Que me perdoem as domésticas, das quais tenho muito apreço e respeito, ainda mais pela minha secretária de todas as horas, afinal, cuidar de homem que mora sozinho é ter vida dura.
Mas a porta dos fundos não é o caminho mais curto apenas pra escapar de possíveis flagrantes. O perigo pré-estabelecido nas praticas fetichistas sugere a porta dos fundos como uma possível entrada sorrateira de um (ou uma) raptor (ou raptora) a procura da vitima que consciente lhe espera.
Quem se dispor a fuçar dentre as mais de mil matérias aqui do blog saberá que tenho como princípio admitir que uma fantasia pra ser bem concebida precisa de total dedicação.
E o que é isto? Os personagens da trama, no caso os praticantes, devem estar cientes de que a aventura só tem graça se o teatro de sonhos estiver montado. Ora, se eu sou o algoz e ela é a vítima precisa haver a química, a entrega de ambos pra que tudo saia de forma perfeita.
Um sorriso, uma possível volta à realidade, uma frase mal colocada, qualquer ato deste tipo é o prenuncio de uma grande cagada. Neste caso, o ponteiro baixa de cem a zero num mísero segundo...
E se isso acontecer brother, a porta dos fundos poderá ser também a serventia da casa.
Por isso a necessidade extrema de tudo ser acertado antes. Como num filme fetichista em que cada ator ou atriz sabe exatamente o que vai fazer pra que tudo saia correto.
Não dizem que a vida imita a arte? Pois então, a regra aqui se aplica na totalidade.
Claro que contando causos há passagens hilárias.
Um amigo a pedido da parceira se vestiu de Batman, o homem morcego, para simular um ataque consentido que terminasse numa noite perfeita. O sujeito foi atrás, alugou a fantasia e correu o sério risco de ser flagrado pela câmera de segurança do prédio onde ela morava. Tudo ensaiado, combinado, enfim, a moça de camisola assistindo televisão e o intrépido super-herói mascarado entrando pela porta de serviço.
Ela não o tinha visto antes com o traje, o que foi o problema. Porque ao ver o parceiro vestido de Batman a mulher soltou uma gargalhada infinita que pôs tudo a perder. Foi-se a noite, e, por fim, o relacionamento.
Imagine a cara de tacho do cidadão vestido de Batman ante um sorriso descontrolado da parceira? É de doer.
Há casos, porém, em que o acaso conspira contra. Uma amiga me disse que combinou uma cena com o parceiro de estupro consentido. Até aí tudo certo. Roupa rasgada, a mulher atirada na cama, tudo indo de vento em poupa até o momento que já com o drops encapado ela percebeu que a camisinha tinha furado. Aqui a falta de sorte foi à questão.
Exemplos existem aos montes e cada um pode contar uma dessas historias em que nada dá certo. Os finais nem sempre têm o mesmo sentido. Podem terminar em lamentações entre ambos e a conseqüente promessa de tentar outra vez ou até mesmo num rompimento definitivo, quando uma das partes percebe ironia e descaso de quem deveria estar também inserido num mesmo contexto.
Uma exposição ao ridículo pode fazer do fetichista uma pessoa grosseira ou arrasada. Grosseiro se ele apontar a porta dos fundos como o caminho para que a parceira se retire, e arrasado se ele tomar esse rumo cercado por um sentimento de vergonha absoluta.

A solução pra isso é bem simples: problemas e neuras devem ficar do lado de fora.
Feito isso, a possibilidade de tudo dar certo aumenta consideravelmente e o fetichista poderá, enfim, usar a porta da frente, pra entrar e sair com o mesmo pensamento e satisfação.
Porque se alguma coisa não sair como foi combinado, basta uma conversa pra que tudo se ajeite e noutro dia se pratique mais uma vez.
Lembrando sempre que a fantasia só se torna um fetiche quando praticada várias de vezes, e, por essa razão, passe a ser essencial para que o prazer seja alcançado na totalidade.