terça-feira, 23 de julho de 2013

Noite (im) perfeita


Ela sabe tudo de BDSM e mais alguma coisa. Estudiosa e antenada.
Ávida por um encontro sem planejamento prévio, ela topou uma dessas aventuras pouco comuns: realizar a historinha no carro.
Evidente que havia certos inconvenientes. O frio de rachar que anda pelo centro-sul e o carro que acomodaria ela com 1.74 e ele com quase 1.90, mas nada que a fizesse declinar do tal convite inesperado.
E como já se conheciam de outras jornadas tudo começou com beijos e carícias. Os vidros foram embaçando e a centelha da moça deu liga, trazendo a dominadora na conversa. Então percebeu que naquela posição só seria possível dar uma bofetada e apertar os tomates do cidadão. E foi “de com força” pelo urro do sujeito.
Trocaram de lugar, acharam que o banco traseiro era a melhor opção, mas quando um carro de policia passou devagar desistiram e voltaram à posição de origem. Que drama brother...
E toma-lhe salto na cara do rapaz que engolia sem enxergar nada naquela escuridão.
Na tentativa fracassada de lhe dar um pisão acionou a buzina. Bola fora! Tentou asfixiar o cara com o cinto de segurança e percebeu que quanto mais puxava mais cinto desenrolava e não achava o ponto que deixasse o ato seguro. E vieram mais tapas e espremidas no saco pra tentar animar a festa...
Cansada de tentar achar espaço onde não havia, mandou o sujeito se enfiar embaixo do painel do carro na altura do banco do carona onde estava. Dá pra imaginar um cara com quase um metro e noventa agachado naquele vão? Maldade pouca é bobagem! E ele de alguma forma conseguiu se enfiar no cubículo e de lá recebeu ordens explicitas para começar o sexo oral.
Ela me confessou que naquele instante teve uma loucura pra invadir o cidadão. Pra quem não entendeu, a moça queria introduzir o dedo no rapaz, fazer o famoso fio terra. Mas cadê espaço pra isso? Frustração.
Mas o camarada mandava bem e nada melhor havia que o sexo baunilha iminente.
Ela entrou na onda. Mas quando estava se adaptando a nova idéia o carro da policia aparece e o fogo abaixa. Pior era o parceiro de cócoras encaixado entre suas pernas. Se o carro para pra averiguar como explicar aquilo tudo? E ela não é tão exibicionista assim.
Mas foram levando e ela insistia em enfiar a cabeça dele entre suas pernas já com toda a força que podia. Os cabelos curtos em suas mãos se transformaram em rédeas. E balançou tanto a cabeça do pobre diabo que o enjôo foi fatal.
Dá pra imaginar a cena?
Agachado e todo borrado o rapaz era a imagem da decepção. E minha amiga não agüentando o cheiro forte daquela cena dantesca, abriu uma fresta no vidro e o viu implorar pra fechar. Detalhe: o sujeito estava peladão. Enfim a cena estava desenhada, porque ela colocou o casaco, suportou o cheiro e mandou que terminasse o serviço.
Submissão absoluta!
Esse relato é real. Aconteceu nestes dias de inverno e a pessoa me merece total amizade.

Muitas vezes as situações constrangedoras podem ser suplantadas pelo entendimento.
A lógica recomenda que as reações sejam respeitadas. Existem pessoas avessas a este tipo de situação o que torna impossível falar em continuidade após um acidente de vômito, por exemplo.
Pra esses casos não há regra e nem liturgia capaz de traçar uma linha. Cada pessoa tem um tipo de reação diante de um fato.
Tanto é que minha amiga me garante em caixa alta que o final valeu à pena.
E se valeu fica como um caso bem contado e com um final inesperado, mesmo pra alguém como ela que ama o que pratica.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Uma Noite de Primavera


Ele olhava para o celular e não se importava muito com o que se passava ao redor naquele bar.
Sequer sabia a razão de estar ali. Mas estava. Não esboçava emanar simpatia gratuita e tão pouco dirigia o olhar a algo específico. Parecia um turista em terra estranha.
De repente um vulto e um cabelo milimetricamente cuidado lhe chamaram a atenção.
Era impossível ver o rosto que ostentava o penteado alinhado e o corpo perfeito. Ela estava de costas.
Bradou pra si mesmo: “santa perdição! Se eu pudesse...”
Naquele instante ela deu uma guinada e ele pode ver a magia absoluta através de um olhar lindo que lhe chamara tanta atenção e cada vez mais se convencia que a bela imagem seria somente admirada, e nada mais.
Distraiu-se com o celular e num instante aquela bela mulher já não estava. Lamentou.
Pôs-se a levantar em busca de um trago e ao fazer a volta no estreito corredor recebeu um pisão na ponta do dedo junto com um esbarrão. Nessas horas que se admite a cumplicidade do Cosmos com o desejo. Porque a dona do cabelo inconfundível encabulada lhe pediu desculpas. Retribuiu com um sorriso, e se lixando se doía ou não a convidou para um drinque. Foi a melhor dor do universo!
Todas as conversas que se seguiram desde então traduziam um encontro que tinha ares de estar previamente marcado. Não se sabia onde ou por que, mas o destino os levava a algum ponto qualquer, parecido com o oceano em busca do céu. O limite não tinha lógica alguma.
Até acontecer a inevitável primeira noite.
Do alto de sua experiência tinha total ciência que deveria saber como lidar com o vaso de porcelana chinês que trazia em mãos. Pensou em Dustin Hoffman, na primeira noite de um homem e seduziu. Era preciso. Aquela Deusa de Negro não cairia num conto qualquer. Era inteligente, sagaz e perceptiva demais pra cair num canto do cisne sem graça.
Porque a idéia era conflitante com o que hoje se entende por encontros. Ela a queria, pra ele, pra sempre, como um todo.
E aquele quadrado mágico rodeado de espelhos e com uma linda banheira próxima a cama era o pedaço mais valorizado do universo naquele dia. Foi então que ele tremeu. Quem sabe o coração quarentão não estivesse pronto para viver aquele tipo de sentimento, mas como ele se preparara a vida toda pra viver a melhor de todas as fantasias que havia sonhado não se deixou abater.
Desembrulhou pernas perfeitas enrolando a meia fina de seda para baixo. Pôde contemplar a olhos nus o que a natureza havia desenhado com extrema relevância. Os pés irretocáveis davam um contorno final a todo o contexto emanando volúpia. E lá estava ela com o busto desnudo como tivesse sido esculpida durante anos em que esperou por aquele dia.
Imaginou o fetiche. A parceria estava numa tira de roupão e com ela amarou-lhe as mãos.
Ela consentiu com um breve sorriso enquanto ele explorava cada pedaço de pecado que tinha diante de si. Chamou-a ao orgasmo, uma, duas, várias vezes. Ela palpitava doses de tesão como quem toma um Martini.
Nem se importou quando ela sem qualquer delicadeza livrou-se das amarras e iniciou uma cavalgada sem fim. Àquelas horas estavam destinadas a que o prazer fosse todo dela, porque o maior dos gozos que ele poderia sentir aconteceu quando cruzou a porta.

Daquela noite levou uma fotografia de um sorriso no celular. Eternizou o momento num simples registro do que foi uma noite fria de começo de primavera.
Sabia que haviam feito um pacto de cumplicidade que o tempo seria incapaz de destruir, e nem mesmo qualquer desistência mudaria o destino traçado por eles naquele dia.
Passado tanto tempo eles conservam o amor e o desejo que construíram através de olhares e doses exatas de fetiche bem feito. Hoje ele a pediu em casamento e ela anda pensando no assunto.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Abstinência Fetichista


Chega a bater um leve desespero…
Dá tremedeira, comichão e outros bichos. Porque ficar muito tempo sem dar de cara pra fantasia preferida é como caminhar no deserto sem uma garrafa d’água. Exagero?
Nada disso, só quem sente é quem diz.
Conheço bondagista que chega a amarrar a si próprio em busca das emoções que andam em falta. De dar dó mesmo... Nunca soube de casos de sádicos que se espancam porque seria o fim dos tempos, mas que existem masocas se maltratando na encolha sem abrir o bico é fato.
Um parceirão louco por pés pedia sempre um sapato usado da namorada. Não fazia coleção, mas na falta, ele metia o nariz lá dentro e aplacava seu desejo.
Na verdade, a abstinência fetichista cumpre etapas. Porque às vezes o próprio é o responsável pelo afastamento. Basta começar a surtar com reciclagem, com a busca da parceria perfeita e o tempo passa sem pressa, mas depois o bicho pega. E quando isso ocorre se instala o terror.
Então surgem fatos constrangedores. Os marmanjos pagam um mico bem maior e a polução noturna é inevitável. Para as moças, basta lavar as roupas íntimas, mas os brothers gastam uma grana preta com lavanderia porque os lençóis viram alvo da fúria fetichista retraída.
E os efeitos não cessam nessas transas desconexas durante os sonhos.
Já vi mulher subindo pelas paredes com as unhas, dando patada em tudo e em todos porque anda distante daquilo que ela mais gosta. Se para umas pessoas sem um pezinho do lado de cá da trincheira é complicado, imaginem pra quem a fantasia é um êxtase em dobro?
Como diz o jargão: “as mina pira véi!”
E como piram. Tentar um “approach” junto a uma dominadora sem parceiro é como colocar a cabeça na boca de um leão no zoológico. E as submissas? Assumem sua própria abstinência e chegam a postar em seus espaços em letras garrafais todo seu descontentamento.
Vocês poderiam dizer que não é bem assim. Que basta abrir o berreiro e logo pinta algo novo pra consolar as moças. Porém, nem tudo que agrada Chico também agrada Francisco e o que elas querem passa longe de colocar um anuncio de classificado implorando por umas chibatadas. Na verdade, elas anseiam por um serviço completo, algo que elas possam se entregar e se sentir plenas.
Fetichismo não é sinônimo de vadiagem, pelo menos pra alguns...
Resolver a abstinência fetichista pra alguns homens não é tão complicado. Existem as moças de vida horizontal, as meninas de aluguel que uma vez cadastradas topam algumas cenas mais calmas. Mas o sujeito não admite pagar pelo sexo e muito menos pelo fetiche. Então só mesmo realizando a fantasia com uma boneca inflável ou um manequim de loja.
É lógico que o sexo de aluguel serve pra ambos os sexos. Afinal, também existem os go-go boys que topariam suprir as carências das moças. Entretanto, o grau de exigência das madames é um pouco mais acentuado que o dos homens, e isso, acaba por criar um hiato importante entre a vontade e a realização.
De fato, falar em abstinência fetichista é como enxugar gelo. O praticante pode colocar de lado, está acostumado com isso, uma vez que em noventa por cento dos casos a vida nunca foi um mar de rosas. Porém, depois de provar da fruta esquecer o sabor é muito mais difícil.

Masturbação não resolve, é paliativo.
Deixa em falta o fator pele, o olho no olho e o cigarro depois da cena não tem o mesmo sabor.
O jeito é batalhar e cortar um dobrado pra sair da crise antes que ela tome proporções gigantescas e cause danos ao patrimônio e leve o fetichista a terrível desistência.
Pra passar o tempo, basta relembrar o quanto foi difícil chegar até o entendimento de si mesmo e, com isso, o oxigênio torna-se mais puro e o tempo não vai causar a ferrugem que você tanto teme.


Depois, quando o sol voltar a brilhar, pense no quanto patético você foi ao deixar escapar o que tinha de melhor nas mãos.