segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Sábado à Noite


A porta do elevador já estava fechando e escutei: “sobe?”
Apertei o botão e segurei.
Aquela mulher montada, vestida para matar, roupa justa num corpo perfeito e a quantidade exata de tinta nos longos cabelos, marcou o sexto andar, eu ficaria no quinto.
O elevador é moderno, mas lento, tempo suficiente pra sentir o bom perfume francês e olhá-la de cima abaixo enquanto ajeitava o cabelo.
Nunca a tinha visto por ali, aliás, morar num flat há três anos e meio não dá o direito de saber quem reside, quem passa ou quem simplesmente habita por uns dias.
O salto a deixava com quase um e setenta e cinco, uma bela sandália e os pés bem cuidados.
O vestido cinza com tons de preto, a boca marcada por um brilho suave.
Ela estava séria, nem olhava pra trás e parecia encantada com a cor metálica do elevador frio, sem vida, que subia e a deixava ansiosa por chegar.
Aonde iria? Havia uma festa? Era cedo demais pra alguém voltar pra casa e se estivesse rolando uma simples desistência, aquela mulher carregava uma desilusão. Era intrigante.
Pensei nos fetiches possíveis de serem imaginados com aquela criatura feita sob medida para alguém naquele lugar, naquela noite de Sábado, que não era eu.
Dizem que o “se” não entra em campo, mas ali parado num elevador voltando pra casa depois de um dia perfeito com a pessoa ideal, só me restavam dúvidas e curiosidade. E se ela chegasse para ver seu namorado? Se ela fosse garota de programa? (Não levava jeito não!). A mulher tinha o pecado tatuado nas costas pra chegar na casa de alguém atraída por um joguinho de cartas qualquer. (Bola fora!)
E se ela fosse uma dominatrix levando na bolsa chicote, velas e algemas para esquentar a noite? (Grandes chances, submissão passava longe...). Embora em alguns casos as aparências enganem a primeira impressão é mesmo a que fica quanto mais num plano totalmente criado pela imaginação.
A vida nos minutos que passam dentro de um elevador tem suas particularidades. Se você está apertado para chegar em casa e ir ao banheiro demora uma eternidade, mas se ao seu lado uma linda mulher exibir seus encantos, tudo acontece em preciosos segundos que se perdem num estalar de dedos.
E como tudo que é bom dura pouco, era minha vez de ir embora e deixá-la sozinha em busca da sua história. Pedi licença, ela chegou para o lado sem dar um sorriso, um olhar e continuei pensando nos fatos e possíveis conseqüências daquela noite. Meu destino estava traçado e um bom filme até chegar o sono era meu alvo.
Tentei esquecer o assunto, mas foi inevitável deixar de pensar na cena perfeita que já se formava em meu subconsciente. Então bolei um roteiro, pensei nela chegando com um sorriso largo na porta do felizardo que a esperava impaciente.

Bebeu uns drinques, foi se despindo e enchendo a cama com o cheiro de seu perfume.
Beijou, rolou sobre os lençóis e foi amarrada com as mãos abertas na cabeceira da cama.
Experimentou o fetiche pelas mãos de um eficiente bondagista que a fez ter certeza absoluta de que cada momento valeu as horas de preparo para ser a mulher fatal naquele Sábado.
Despertei num Domingo bonito e saí cedo pra aproveitar o dia.
Quando toquei no botão do elevador me veio à lembrança do que eu havia me permitido sonhar.
Daí percebi que devo estar tão ligado nesse tipo de trama que meus delírios viram histórias reais

num vídeo bem feito, quem sabe no mesmo elevador, um dia desses qualquer.
Mas a mulher não tinha jeito de dominatrix?
Só se for em outro enredo. Esse já foi planejado.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sr. ACM
O verdadeiro fetichista não teve ter vergonha em querer realizar os seus sonhos.
Quando a vida real se alimenta de sonhos sem realizações a vida fica sem sentido,uma total frustação.
Não podemos deixar de viver, aproveitar as oportunidades por que elas são poucas e temos que viver intensamente as oportunidades oferecidas.