terça-feira, 11 de setembro de 2012

BDSM e Fetichismo



As pessoas costumam dizer que gostam de certas práticas no BDSM, mas não se assumem fetichistas.
Mas em algum lado BDSM e fetichismo se misturam. Pode apostar.
Mesmo de forma totalmente inconsciente há a mescla básica e necessária.
Descobri isso faz tempo. Exatamente quando cheguei em Amsterdam.
Porque na terra gelada dos caras rudes e mulheres grandes sadismo e masoquismo nunca foram tão bem vindos. E acho que pela primeira vez pude entender que um masoquista não se realiza enfiando uma agulha no dedo por sua conta e risco, ele precisa do sádico e da cena.
E a cena é a fantasia, o fetiche latente e pulsante.
O BDSM sempre carrega essa dúvida.
Há praticantes que pensam em cenas mortas, sem glamour. Basta ter a dor pra ter prazer. Talvez o fetiche venha depois, através de fotos, de lembranças, de glórias. Uma marca, uma cicatriz. Mas se este praticante pudesse criar sua cena e estabelecer um elo entre o que gosta e o que reluz, ele teria a simplicidade da criação atendida na plenitude e, talvez, pudesse até mesmo melhorar sua performance.
Ora, fantasias não se definem por acaso. Deve haver um contexto, razões que sutilmente acelerem o desejo. É o momento em que se cria o enredo e se traça planos pra levar os sonhos à realidade. Isso se chama identificação com o próprio desejo.
Admito que alguns dominadores e dominadoras queiram de seus parceiros a entrega nua, completa e definitiva e através dessa devoção estabeleçam seus próprios critérios de fantasia. Entretanto, com uma pitada de simbolismo a submissão cria asas e permite a quem está inclinado a admitir a relação à obtenção de doses de adrenalina para a sua própria combustão.
No bondagismo é mais simples. Alguém é vitima de um seqüestro lúdico e a cena está posta.
Nem tanto. Os desejos afloram em sentidos diferentes por quem entende a fantasia e seu conteúdo. Sapatos, botas, pés, cordas, correntes, algemas, couro, enfim, tudo isso é o fetichismo representado por objetos e ações que vão compor um cenário.
E dessa forma a relação SM também deve ser norteada. Qual submisso não gostaria de ver sua rainha em trajes de gala? A transa perfeita sempre será perfeita, mas se puder vir adornada em detalhes que provoquem todas as sensações imaginadas haverá mais libido, tesão.
Existem fetiches comuns com práticas distintas. A moça vestida de colegial, por exemplo, será para o sádico ou o bondagista a imagem do prazer. Cada qual viverá a cena a seu modo, mas o fetichismo estampado no uniforme será o mesmo.
A simbologia é sempre bem vinda. Conheço submissa que é doida pra se entregar a um dominador vestido de militar. Fácil, simples, há casas especializadas que alugam ou vendem esses trajes. Mas elas travam com medo de serem abusivas. Por isso, morrem com água na boca sempre esperando pelo dia em que tomarão coragem de dizer o que pretendem.
Não há segredos absolutos dentro do BDSM que morram trancados. Se a onda é fantasiar, criar e reinventar sentimentos guardados, o travamento é nocivo e muitas vezes relacionamentos terminam sem que tenha havido a cumplicidade necessária pra abrir o jogo.

Talvez essa seja a principal razão para que todos os praticantes façam uma releitura de suas atividades. Valorizar cada passo conquistado dentro do BDSM é sadio. Não se deve viver uma cena por viver. Às vezes o óbvio é tão mesquinho que gera até arrependimento. O sujeito diz a ele mesmo: “putz, podia ter feito melhor”.
Todos nós carregamos nossas culpas e remorsos. Não dá pra repetir e se arrepender sempre.
É preciso ousar e criar pra que a fantasia não vire algo sem sentido ou sem imaginação. Se o fetichismo existe pra quebrar a rotina, atender 

desejos diferentes, que ele seja então totalmente inusitado como o próprio nome explica. Um feitiço.
O bom disso tudo é ouvir no final da cena alguém dizendo que foi a melhor que existiu desde que se entende como fetichista. Daí basta caprichar na próxima e ser feliz.

2 comentários:

Anônimo disse...

Oi ACM. Como sempre a escrita impecável na disertação do tema... agora uma coisa para sua habil caneta...

Eu vejo que existem dois "sabores" distintos quando a gente se refere ao "S" de Submissão no Bondage: O primeiro, poderia se chamar da submissão pura quando o Bondagista procura o tipo "inocente vitima". Porem, existe também a "falsa" submissão, por assim dizer, ou seja, a vitima não é submissa, muito pelo contrario, ela é dominada a força. Já vi inclusive alguns filminhos da "Dominatrix dominada"... Alias, esse é um role play bem mais difícil de implementar na prática... precisa muita combinação de "safe word"...

Manda lá sua opinião....

ACM disse...

Caro(a) Anônimo (a)

É assim.
Primeiro te agradecer pelos elogios e vamos a caneta...rs

Minha opinião é simples: num jogo de bondage não necessariamente precisa existir a submissão. Claro que alguém se submete ao aprisionamento quando da própria prática pode haver um entendimento de entrega, mas a submissão ao pé da letra não seria um ponto fundamental.

Se falarmos em roleplay o comando muda de mão, daí a "troca de vitima" ficaria tão evidente anulando o contexto da submissão.
Daí a submissão que você chama de falsa seria interpretativa, ou seja, um teatrinho entre adultos que resolvem viver uma aventura.
Seriam muito mais atores do que praticantes de BDSM.

No casos das Dommes conheço exemplos em que existe essa química de viver os dois lados. Não seriam switchers desde que as práticas de BDSM fiquem isoladas, o que de certa forma significaria o abandono da safe word de proteção.
Claro que toda prática necessita de muita combinação e cuidados, e já foi muito falado aqui sobre a necessidade de ter até obetos cortantes que possibilitem a quem está aprisionado se libertar caso ocorra algum imprevisto.

Dito isso, creio que respondi seu inteligente questionamento, caso contrário te convido a repostar alguma réplica de algo que tenha ficado subententido.

Grande Abraço!