Muitas vezes a gente se perde no tempo. O que sobra? Lapsos
de memória que os anos se encarregam de encarcerar. Mas vez por outra passa um
filme e nos vemos como na tela.
É quando se pode ter uma idéia do traço que desenha o
fetiche em nossas vidas.
Evidente que a infância é distante e inocente demais pra
fazer parte do contexto, mas ela significa em certos casos o próprio apego a
determinados valores. Os desenhos animados mostrando donzelinhas em perigo como
cenário e as velhas bonequinhas das primas, irmãs e até mesmo amiguinhas, nas
quais se usava linha de costura pra amarrar. Tudo isso monta um cenário.
Então vale a pergunta: como tratamos nossas memórias
fetichistas?
Elas têm um significado importante, embora muitos a
desprezem e até sintam vergonha de certas atitudes impensadas, e, como tudo na
vida, diversas vezes nos arrependemos de não ter seguido outro caminho. Mas
elas estão lá, em algum lugar que o tempo guardou.
E são tão nossas quanto os bens mais valiosos que
acumulamos.
Há pessoas que se dedicam a preservar esse passado.
Começam se espelhando em sua própria historia e, com isso, arrebatam seguidores
que encontram na mesma trilha diversas semelhanças esquecidas. Postam filmes
antigos, imagens de revistas e até fotografias que nos fazem voltar no tempo e
encontrar as tais lembranças perdidas.
Entendo que fetiche é evolução. Algumas mudanças são necessárias
durante a caminhada de quem se embrenha por esse universo. A inércia é
prejudicial e muitas vezes alguns criam ramificações no passado que os fazem
fechar os olhos a qualquer mutação.
E isso não é exclusivo de bondagista. A masoquista
convicta que criava atritos em troca de uma boa surra ou o podólatra que quando
menino brincava debaixo da mesa pra chegar perto dos pés das amigas da mãe.
Qualquer fetichista que traz com ele o impulso da maternidade já criou seus
roteiros dentro da inocência e sabe a que estou me referindo.
Por isso, costumo tratar bem minhas memórias fetichistas
e até me esforço pra preservá-las. Entretanto, não vivo preso a elas e procuro
evoluir pra meu próprio beneficio. Da mesma forma que um viciado em bondage
deixa de amarrar os bracinhos de uma boneca de plástico pra imobilizar uma
mulher de verdade, ou esquece os filminhos com a heroína presa nos trilhos do
trem e assiste a bons clipes ou longas de puro bondage.
É dessa forma que os guetos se firmam no cenário do BDSM.
Porque há a mistura entre os que trazem o fetiche do berço e os que encontram
ao longo da vida. Não há distinção entre esses grupos, apenas sensíveis diferenças
muito mais evidentes quanto ao aspecto necessidade. O que não significa que
alguém recém chegado não possa ter a mesma dependência da prática, mas a
carregará por um tempo bem menor e não terá as mesmas lembranças.
E pra essa galera do gueto sempre prego a teoria de que
qualquer praticante de BDSM deve olhar com bons olhos o fetichismo. Tal atitude
torna a prática mais intimista e cria uma atmosfera de magia maior que uma
prática apenas por realizar um simples desejo.
O fetichismo cria um elo entre desejos e fantasias e com
absoluta certeza intensifica as lembranças sem importar de que fase da vida
elas provém.
Nos tempos pré-globalização ainda sem a internet existia
uma interação interessante. Tudo funcionava por cartas, eram os chamados “pen
friends”. Ainda que os fóruns fossem raros e distantes muitos obtinham feed
back através desse caminho. Era bem bacana saber o que os caras do Hemisfério
Norte, onde o BDSM era tratado com respeito, pensavam sobre o que aqui era apenas
um ensaio solitário sem saber se existia vida além das nossas reflexões.
Tudo isso são lembranças e registram cada passo que se
agrega pra chegar onde se imagina.
Claro que nos dias de hoje as lembranças têm
uma conotação
mais direta e ousaria dizer menos românticas. A aproximação do planeta
interligado causa efeitos imediatos e nos afasta um pouco do imaginário e isso
faz com que se forme um hiato entre ser e supor.
Mas jamais deixarão de fazer parte do nosso bloco de
notas por toda a vida.
Um bom final de semana a todos!
4 comentários:
Adoro ler os posts saídos do forno..rs..Ainda bem que estava logada no meu blog e vi a atualização ;)
Tempos idos, boas lembranças :) Engraçado que ao ler sobre a masoquista fiquei pensando em minha vida de aluna de colégio interno onde a pressão psicológica é absurda e o medo é infernal, desculpa o trocadilho..rsrs...
Eu tinha um medo terrível de freiras e dos lugares escuros daquele colégio frio e imenso. Mas adivinha? eram os locais mais escuros e proibidos de passagem que eu procurava, esperava avidamente um castigo, "ser pega" era meu sonho mais alucinado, "viajava" no que aconteceria e literalmente viciei no medo ;)
Terminei a leitura me lembrando dessas e outras coisas da infância, caiu a ficha que sou fobofílica..rs..
Como vc disse no post algumas pessoas trazem o fetiche do berço, me incluo nessa ;)
Esse post está salvo em um arquivo especial, me marcou bastante :)
Bjos amigo tão querido
Nynna
Esse teu "medo" fetichista signifa uma acendencia bondagista muito forte...rsrsrsrs
Sério, quando se traz a fantasia do berço era brota nos lugares e situações das mais inesperadas possíveis.
Outros beijos
Sem dúvida também me trouxe as mesmas lembranças...eu fazia tudo que queria usando recorte e colagem de revistas... nessa dança, amarrei muita gente, como a Angelica e eu tinha um poster de tamanho quase natural da Luciana Vendramini (alguem lembra?) que saiu nua numa playboy especial... consegui fazer um trabalho muito bacana ali... um dia, com o risco de ser descoberto, empacotei tudo, inclusive minhas fitas de VHS, numa caixa e descarreguei num canto lá da favela da Maré....ou foi pro lixo ou fiz algum favelado muito feliz...rs rs rs....só fiquei mesmo com o que eu podia ter em meio digital com senha....
O que me leva a uma pergunta interessante....vc já viu aquelas bonecas "Real Doll" ? Sao caras mas fico pensando se não são um bom investimento de longo prazo para um Bondagista.
seu amigo Jonas
Grande Jonas
As bonecas real dolls são caras sim, mas pra quem curte um damsels in distress e não quer se envolver em carne e osso, de repente é uma saída.
Eu parto da impressão que a época dos recortes, das bonecas fica suplantado depois que você consegue ao vivo, pele, suor, e tempero. Mas os caras chegam a dizer que algumas se colocam no forno e se tornam muito proximas a realidade.
Daí vai de cada um...
Pois é brother, se havia um bondagista na Maré ele te agradece até hoje...rs
Abraço!
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