segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

A Galinha do Vizinho


Sábado de sol, cerca de quarenta graus a sombra e o ar refrigerado do estúdio estava longe de dar vazão.
Explico: começamos a produzir os vídeos e sets fotográficos para o Bound Brazil às dez da manhã e só terminamos no final da tarde. Oito horas direto, sem tirar de dentro, pau na máquina mesmo. Sete lindas modelos, cordas, mordaças e câmeras, o cenário que qualquer bondagista daria um dedo pra viver.
Apesar do aparente cansaço, só deu tempo para uma ducha caprichada e rumar para Niterói onde um grupo de amigos e amigas havia marcado um encontro. Aliás, diga-se de passagem, não havia lugar melhor para esfriar a cabeça depois da agitação que aquela vista da Baía da Guanabara.
Em meio a um grupo de pessoas completamente eclético, confesso que metade das pessoas jamais tinha visto antes, surgiu uma discussão entre duas amigas que demonstra claramente aonde o preconceito pode chegar.
Ao confessar que era amiga de uma prostituta, uma das presentes foi literalmente atacada por outra conhecida totalmente contrária a prática exercida pela mulher. Detalhe, aquela que se posicionou contra a atividade da garota em questão é declaradamente lésbica.
Daí é a velha história: a galinha do vizinho é sempre a que não presta.
Aquilo que não aceitamos que façam conosco jamais podemos nos permitir de fazer com o próximo. Isso deve ser definido como regra básica de comportamento e uma pessoa que para muitos olhos é um prato cheio pra comentários inconseqüentes, não pode ter esse mesmo tipo de atitudes.
Segundo um amigo fogo cruzado não dói, mas em casos de preconceito sempre é bom olhar no espelho e se preparar para ser vitrine.
Esse tipo de conversa numa roda de amigos gera opiniões, mas que muitas vezes ficam entaladas na garganta de pessoas que não desejam se expor, principalmente diante de quem está discursando.
Mas não pude me calar e acho que estraguei a noite falando sobre meus conceitos.
Vivemos numa democracia e cada tem o direito sagrado de ter opinião, o que não reserva o direito de falar de quem não está presente.
Essa mulher, que não conheço, não escolheu ser prostituta, por alguma razão que não tenho conhecimento ela entrou nessa roda e resolveu ficar. Se é certo ou errado cabe a ela decidir, o que não dá o direito a ninguém de excluí-la.
Acredito que alguns casos de preconceito apareçam de patrulhamento social, onde pessoas metidas a donos da verdade absoluta criticam tudo e todos que em sua opinião não fazem parte do que presumem ser a sua ordem instituída.
Alguns dos presentes sabiam de minha escolha fetichista, inclusive a dita cuja, e como não me importo em ser vidraça ofereço um pedregulho a quem queira ser o primeiro a atirar. Assim deveria proceder minha querida amiga, em face sua escolha homossexual, mas nem sempre a banda toca no mesmo tom.

A noite murchou e quem não estava interessado na conversa aos poucos tomou o caminho de casa. Senti que ela queria arrastar a retórica até achar alguma razão naquilo tudo e ao mesmo tempo se justificar de ter assumido tal posição.
Era tarde demais quando ela começou a se dar conta do tamanho de sua incompreensão.
Ninguém está obrigado a concordar com nada, nem com ninguém, mas é inadmissível assistir a um massacre de alguém que sequer supõe que sua vida está exposta, mesmo a quilômetros de distancia.
Pelo menos a comida e o vinho gelado salvaram a noite...

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