quinta-feira, 10 de setembro de 2009

The Fantasy Maker


Conheci o Carrasco faz mais ou menos uns dez anos na época do “Boom” da Internet.
Éramos um grupo de pessoas que se juntou num antigo site chamado Mandic e que uma vez por mês se reunia no Bar América, na Alameda Santos em São Paulo.
Tínhamos desejos e visões de BDSM distintas como todo grupo fetichista e uma integração enorme onde idéias e sonhos se misturavam num debate infinito, criando milhares de fantasias em nossas cabeças.
Pensava-se em festas e plays, todas as formas de cada um mostrar o que tanto se teclava durante os papos com hora marcada e senha de acesso, porque a bem da verdade todo mundo queria ver as bravatas contadas com o orgulho de saber fazer.
Só que o que era inevitável aconteceu e algumas pessoas começaram a formar par levando o fetiche pra dentro de quatro paredes. Nasceram paixões ardentes, momentâneas e duradouras, enfim, tudo se tornou real a partir de um mundo imaginário.
Nem todos tinham os mesmos sentimentos ou possibilidades, e foi então que o Carrasco começou a criar relatos de fantasias sexuais realizadas teoricamente por ele que logo chamaram a atenção de algumas das garotas. Mas na verdade era um grande delírio, porque o Carrasco era casado e aquelas histórias tórridas eram buriladas demais, parecendo saídas de sua imaginação.
Porém tudo tem seu preço e hora pra acontecer.
Certa vez, trabalhando aqui no Rio, recebi um telefonema do cara através de uma chamada local, tinha acabado de chegar à cidade, disse que estava a trabalho e me falou sobre a possibilidade de um encontro mais tarde. Topei.
Fomos a um bar na Praia do Flamengo e o Carrasco começou com umas histórias cabeludas que custei a acreditar. Me contou de um encontro que teria por aqui, se confessou iniciante no BDSM e revelou que seus contos eróticos nunca tinham se materializado, eram copiados de publicações que achava pela Internet ou em revistas masculinas e necessitava desesperadamente de minha ajuda para bolar um cena fetichista com alguém especial. Minha suspeita acabara de se confirmar.
Depois de tanto insistir para saber de quem do nosso grupo se tratava, Carrasco me surpreendeu com uma amiga que assim como ele era casada com um bem sucedido diretor de um banco. Tinha que cumprir com o combinado, estava na cidade com todas as despesas pagas por nossa amiga em comum e como um bom “amante profissional” iria receber por seus préstimos.
Me senti cúmplice daquilo tudo, não só do Carrasco como dela também, mas mesmo assim tracei o roteiro, dei as dicas de alguns truques e ele foi embora ensaiado sabendo exatamente o que iria fazer para realizar a fantasia daquela mulher.

Ele fez várias viagens ao Rio durante os meses em que manteve essa relação e muitas das sessões eram elaboradas por mim e lhe enviava por email. Acredito que tudo tenha funcionado a contento pelo tempo que estiveram juntos.
Na verdade, Carrasco nunca quis realizar as suas fantasias, se manteve firme no propósito de ser um “fantasy maker” profissional. Vim descobrir um ano depois que ele estava desempregado e sustentou sua vida por um bom tempo às custas dessas visitas ao Rio e outras que se soube mais tarde. Algumas dessas histórias se tornaram lenda e ninguém ficou sabendo que eu fui o roteirista daqueles encontros escondidos.
Nunca me arrependi de ter participado do caso, mesmo de forma indireta e, também, jamais entrei em detalhes ou tentei emitir opinião sobre o assunto.
Prefiro relembrar aqueles anos como uma época maravilhosa cercada de gente interessante e como parte de meu aprendizado fetichista.
Assim como o Carrasco muita gente prefere esse caminho dentro do BDSM e se sente bem realizando a fantasia alheia, algumas vezes com o intuito financeiro ou atendendo a uma questão pessoal.
Tudo isso é parte de um mundo com virtudes e desvios como outro qualquer e a questão de aceitar ou não fica a critério de cada um.
Embora nada tenha contra, jamais faria, mas em momento algum viraria às costas a quem se dedica a essa prática.

Um comentário:

Mimizinha SP disse...

Adorei!!!! Vc hoje me fez viajar no tempo, relembrar uma estória da minha vida que guardo com muito carinho até hoje. Uma época aonde eu conheci, me apaixonei e aprendi o real significado da palavra bondage.
Me lembrei de cada um que fazia parte do nosso grupo, cada um com seu jeito e manias especiais.
Ao acabar de ler esta matéria, fui procurar na internet a música do Roberto carlos - "Jovens tardes de domingo", que retrata muito bem essa saudade que ficou daqueles velhos e bons tempos.
Parabéns pela matéria e muito obrigado por ter me proporcionado tantas lembranças maravilhosas.
Beijos da sua amiga de sempre,