quarta-feira, 20 de abril de 2011

Sonho Consumado


“Me encontra na saída da estação do Metrô.”
O recado foi sucinto e mesmo depois de tantas conversas pela Internet tudo que ela queria era que chegasse o momento de realizar uma fantasia.
Antes disso nunca havia escutado falar em BDSM, regras, conduta, nada. Desejava um seqüestro da forma mais real possível.
Tinha ciência de todos os riscos que estava correndo. Ele era apenas um nome e uma foto enviada por email, e ainda que tudo começasse perto de casa ela nem imaginava o que o destino pudesse revelar.
Esperou impaciente no lugar marcado até escutar o toque do celular com uma ordem: “vá até o final da passarela e não olhe pra trás.” No meio do trajeto uma mão tapou sua boca na escuridão e a voz firme ordenou que ela não olhasse para ele. Foi levada até o carro onde foi jogada com força no banco da frente. Teve os pulsos e tornozelos amarrados com força, a boca amordaçada e os olhos vendados. Não viu mais nada...
Descobriu que estava num motel horas mais tarde quando a venda foi retirada de seus olhos.
Até então, foi atendida por seu “algoz” em todos os detalhes previamente tratados. Disse que o sangramento dos lábios e o dolorido das pancadas não foram pior que o tempo que passou jogada num canto solitária entre um ataque e outro.
Conta que ele a deixou próximo de casa e nunca mais apareceu, nem na Internet e muito menos deu as caras.
Não me cabe analisar os riscos de uma fantasia às escuras. Apesar de ter um masoquismo acentuado, o medo, a angústia e o desespero foram os sentimentos que a levaram a optar por viver uma situação desse tipo. Acredito que se existisse conhecimento profundo do fetiche ela não optasse por tamanha ousadia sem pensar em possíveis conseqüências desastrosas e irreversíveis que este jogo pudesse causar.
Este é um caso real vivido por uma pessoa próxima de quem eu gosto muito e, por ter intimidades comigo confidenciou esse drama.
A experiência de vida e o encontro com o BDSM a fizeram analisar seus atos. Confessou que jamais teria coragem de repetir a façanha e não recomenda a ninguém que tenha a mesma iniciativa.
Um seqüestro lúdico como este que acabei de relatar pode se tornar um jogo muito interessante dentro dos conceitos e regras do BDSM, desde que algumas normas de segurança e consensualidade sejam seguidas à risca. Existem pessoas que praticam essas fantasias e não é preciso que do outro lado exista um desconhecido para fazer o efeito desejado.
Parceiros podem combinar as etapas e definir as regras. Como também pode acontecer num primeiro encontro pessoal, desde que exista conhecimento prévio das atividades de quem vai viver a cena, através de um tempo necessário de convivência ou até de boas informações de amigas que tenham se envolvido em práticas com o parceiro em questão.
Por ser uma prática sexual que envolve cenas violentas, as chamadas sessões de fetiches dentro do BDSM devem ser encaradas com todo o cuidado possível. Ninguém precisa se expor, se arriscar, para estar plenamente satisfeito com a fantasia criada.

Já vivi algumas cenas ousadas, mas nunca deixei o tesão sobrepor a razão.
Como o caso de um parceiro fetichista que amarrou a namorada na mala do carro para forjar um seqüestro combinado e exagerou no acelerador. A garota chegou ao motel com um galo na testa. Pedir desculpas depois é bastante complicado...
Alguns amigos às vezes me chamam de reacionário, anarquista, principalmente quando eu defendo a preservação dos impulsos sem a necessidade de andar com um livrinho de regras debaixo do braço. Porém, condeno os excessos e atitudes impensadas.

4 comentários:

  1. Meu querido, imagino quantas fantasias são realizadas se colocando em risco, como essa que você citou.
    Tenho muito medo de condenar a fantasia de outras pessoas, porque não tenho o direito de julgar, mas ao mesmo tempo acho loucura correr tamanho risco, como você disse o tesão não pode se sobrepor à razão.
    Não creio que você seja reacionário ou anarquista, é apenas alguém que tem o pé no chão.
    Acredito no prazer quando ele é mútuo e sem risco para uma das partes, quando existe risco, o excesso pode ser o prato principal e alguém sair machucado.

    smacks

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  2. Seus textos são muito bacanas de serem lidos. Coerência, respeito às regras da LÍNGUA PORTUGUESA e, claro, fetiche! Sempre acompanho, parabéns

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  3. Angelike

    Pois é moça, em se tratando de um caso real, verdadeiro, as coisas até que sairam bem.

    Eu também não julgo, penso sempre que cada um tem seus motivos, mas serve sempre como um exemplo, principalmente quando uma narrativa como essa é autorizada.

    Muito obrigado por vir
    Beijos
    ACM :)

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  4. MrZ

    Faz tempo que estamos por aqui brother, e acho que por conta disso jamais nos perdemos...

    Um grande abraço e um beijo na Raine
    ACM

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