
Em meio a fogo, violência e balas perdidas soa estranho falar de fetiches.
Não estou próximo ao epicentro do caos, mas por várias vezes já estive e conheço pessoas decentes que vivem por lá. O que fazer? O mesmo que fazem os que estão à distância. Assisto.
E como achar assunto? A noite não pode e não deve ser longa. Os dias ficam tristes e terminam mais cedo numa cidade onde a alegria deveria ser a única sensação possível de haver. Então vou tentar esquecer um pouco do mundo além da minha janela para falar de coisas que daqui a alguns dias se pode pensar em fazer.
Daí me lembrei de uma época em que nada era como hoje. De quando havia respeito à lei e a ordem. O ladrão era um punguista qualquer que acabava levando uma rasteira na rua e entregava o fruto roubado. O cara falava assim: eu vi um três oitão! Agora as armas são de guerra. Pois nesse tempo, que não é tão distante assim, existia o motel das estrelas que era grátis e localizado em ruas ermas, com pouca iluminação. Lá valia embaçar os vidros do fusca para ter privacidade. Claro que os exibicionistas nem pensavam nisso e colocavam a bunda pro alto na maior cara de pau, com o vidro do carro escancarado.
Viver no Rio de Janeiro era bom demais.
Armar pra cima da gata (olha que tinha mulher virgem nessa época) e partir em direção à Floresta da Tijuca, ao Mirante do Alto da Boa Vista, ao Morro do Pasmado ou para uma rua deserta qualquer. Tentar de todos os jeitos e maneiras possíveis. Mão aqui e ali e nada além de um “peitinho” de fora.
Alguém pode dizer: que época chata!
Respondo: tinha seus encantos, aliás, como tudo na vida tem. O grande segredo da vida é achar felicidade no que se tem. Como sonhar com internet, televisão a cabo e liberdade sexual no começo dos anos oitenta? Aí brother, era fazer o suco com as laranjas que havia.
Duas coisas básicas não podiam faltar no carango. Uma caixa de lenços de papel (tem até hoje isso heim!) e uma flanela limpa. Porque a flanela era para dichavar (passar despercebido, gíria da época). E para um fetichista iniciante aquele pano amarelo era o começo de uma grande aventura de bondage. A flanela aparecia do nada e de repente já estava servindo para amarrar as mãos da gata. Uma das formas de começar uma fantasia de bondage é na base da brincadeira inocente juvenil. Anotem a dica, sempre funciona.
Depois era só reclinar os bancos dianteiros de maneira que eles encostassem no de trás.
E tudo acontecia na maior tranqüilidade. Ninguém batia na janela. Nenhum assaltante, nada.
O motel custava uma fortuna e normalmente as garotas não topavam por várias razões: medo de perder a virgindade, uma vez que estariam muito próximas de consumar o ato e também por vergonha. Quando rolava um desses motéis baratos, que carinhosamente chamávamos de Motel do “Oi”, porque sempre tinha um amigo no mesmo lugar, elas escondiam o rosto, ficavam sem jeito e pra voltar era uma merda...
A lição que se tira de tudo isso é única. O prazer de viver num lugar decente, ainda que não existissem os artigos de luxo e conforto de hoje, com alegria e segurança. O melhor de tudo era que quase todos voltávamos pra casa e nos encontrávamos no dia seguinte. Somente um acidente ou um descuido era capaz de nos fazer vulneráveis.
Os tempos mudaram. A vida agora é uma disputa muito louca e ninguém respeita o próximo. A vida não vale um centavo e esta gente brinca com ela todos os dias. Acho que hoje apenas sobrevivemos e antes vivíamos.
E quando tudo começou a m

A mesma sociedade que o teve como um louco, hoje dá mostras que jamais aprendeu a lição que ele escreveu numa simples frase que o tempo tratou de apagar.
Ainda bem que o fetiche segue intacto.
Dias melhores virão!
boa noite Carissimo,
ResponderExcluirsei que seu texto (belissimo e muito muito bem escrito, sou fã incondicional de que escreve "falando"...*pisc) retrada a história, verídica e triste, de sua cidade, porém ela é bastante parecida com a minha, afinal qdo o pcc da as caras por aqui a gente tbm entende quem manda...*pisc
mas sinto meio que na obrigação de comentar seu post, pois tomei sua cidade para mim, desde minha tenra idade, sim sou paulista de nascimento, mas adotei o Rio, a bela Cidade Maravilhosa, como minha de coração e me entristece vê-la assim...
ainda sou uma romântica sonhadora que acha essa bela cidade a mais linda e Maravilhosa do mundo!!
que Deus e esse lindo Cristo de braços abertos cuide e proteja a todos vcs, meus queridos irmãos de coração!!
bjkas ternas
{ternura}_WOLFMAN
obs: tenho um cantinho SM, sinta-se a vontade para visita-lo..ja estou te per seguindo
Caro ACM,
ResponderExcluirsigo seu blog a algum tempo já, aprendi muito por aqui.
Lendo os noticiários dessa barbaridade que acontece no RJ, me lembro dos amigos que tenho por aí, inclusive um que é policial, e dá um frio no estômago, uma sensação nauseante de impotência, de tristeza...como vc bem diz: acabamos olhando através da janela, sem ter muito o que fazer.
Também vivi o início dos anos 80, só que em Sampa, ou seja a patrulha moral e ideológica era bem maior, rs.
Mas a Vida continua, quem sabe essa nova geração que surje mais consciente, inclusive da necessidade de cuidar do nosso planeta, encontre um meio da humanidade abrir os braços, ao invés de fechar as janelas e tremer dentro de si mesma?
Abço
Amigas Ternura e Nynna
ResponderExcluirPrimeiro gostaria de agradecer o entendimento do texto, do momento e até da angústia.
Participar, ter solidariedade, é importante.
O que quis mostrar foi uma ótica diferente, pois com tanta coisa acontecendo em volta, citar coisas boas fica difícil pacas!
O pior foi ver assim que fui embora, alguns minutos depois da postagem, um onibus ardendo em chamas em cima do tunel rebouças.
Isso revolta, deprime.
Mas não há nada a fazer.
Se nossos braços se cruzam é porque nos tornamos passageiros de um trem em chamas.
O sociedade aqui é refém.
De bandidos em fúria, da polícia com os nervos à flor da pele e de nós mesmos, incapazes de fazer alguma coisa enquanto ainda havia tempo.
Eu não elegí este governo, entretanto aprovo o que ele faz agora, porque é enfrentar ou enfrentar. O basta é um grito uníssono: chega!!!!!
A comunidade, os amigos que aqui dão uma paquerada, assim como sempre estou atento ao que vocês escrevem, presta uma palavra de carinho que pra nós vale ouro, porque somos todos iguais e vítimas do mesmo terror.
Valeu garotas, um beijo no coração sempre na esperança que dias melhores daqui a pouco vão começar a nascer.
ACM :)