
Ela falava em tom alto e com gestos.
Era direta, evitava desvios enquanto retocava a maquiagem.
Naquele lugar apertado onde as garotas disputavam uma vaga diante do espelho quase que aos tapas, ela era sem dúvida a imagem da desinibição.
Tudo começou com uma conversa pelo email. Alguém iria produzir um desfile de uma grife qualquer e um dos produtores resolveu ousar e apresentar as meninas amarradas com pedaços de corda de sisal.
Isso faz tempo...
Na verdade, aceitei participar pela divulgação do fetiche, nada a ver com o lado pessoal. Tudo era pra ser feito atrás das luzes e pra facilitar, bolei algumas armaduras de cordas que elas colocariam no corpo e retirariam ao voltar da passarela. Eram oito modelos e quatro armações, e elas iam trocando na medida em que entravam e saiam.
Nem sei se as pessoas presentes deram atenção àqueles detalhes, mas pelo menos funcionou bem, embora os nós precisassem ser retocados a cada retorno. Paciência, quem mandou inventar moda?
Mas o que rolou naquele camarim é a razão desse artigo: a verdade, nua, crua e absoluta.
A tal garota desinibida ao emprestar seu corpo para servir de molde para a armação de sisal, desenrolou uma conversa e resolveu falar de sua vida, de planos para uma viagem nos dias que viriam.
Daí, papo vai e papo vem, resolvi perguntar o que ela fazia na vida além de ser modelo.
A resposta foi na lata brother, sem derrapagem: “eu sou puta”.
Não há exageros, porque ela nem tentou burilar a frase. Poderia ter dito garota de programa ou até prostituta, mas ela falou exatamente como eu escrevi.
Se quem fala a verdade não merece castigo essa garota está perdoada.
Começou a dar plenas satisfações do que faria, sem que eu ao menos tivesse pedido, afinal ainda estava meio anestesiado com o tamanho da sinceridade daquela mulher. Disse que havia estado na Europa antes levada por um namoradinho gringo, mas que desta vez ficaria um mês por conta própria e iria levantar uma grana pra voltar com o bolso forrado.
Bom, se eu fiquei boquiaberto com aquela conversa garanto que o mais experiente leitor também ficaria. Em tantos anos de experiência nunca havia visto tal desenvoltura, conhecimento de causa e cara de pau como naquele dia. Vale lembrar que naquele camarim haviam outras pessoas.
Nada contra as meninas que se dedicam a vida horizontal. Já fiz várias menções a essas garotas aqui no mais alto grau de respeito à escolha. No fundo, é mesmo uma questão de foro íntimo, ou não?
No frigir dos ovos, essa história traz algumas lições. Nem sempre é legal falar certas coisas sem pensar, principalmente a desconhecidos, e é um péssimo cartão de visitas.
Por outro lado, mostra total controle de ação e nenhuma vergonha de se expor. Mais ou menos assim: da minha vida cuido eu e ninguém tem nada com isso. Mas precisa falar?
Às vezes a sinceridade excessiva ofende, não a mim, mas a alguns.
Imaginem se em meio a uma festa onde ninguém me pergunta qual a minha fantasia sexual favorita e eu começo a falar de fetiches?

Falar a verdade é legal, ninguém deve condenar quem não tem vergonha de expor seus atos e planos. Só que na vida tem hora pra tudo, e naquele dia não era o momento de falar ou ouvir o que ela tanto se orgulhou de dizer.
De repente, perdeu a chance de ficar calada e deixar que cada um pensasse o que quisesse.
Era melhor?
Bem, espero que me permita discordar principalmente da sua comparação. Uma situação é a mulher declarar que é garota de programa, que nada mais é do que uma profissão. Outra bem diferente é dizer arbitrariamente os seus fetiches.
ResponderExcluirQuando uma mulher declara ser prostituta, ela espera por uma reação negativa. Por isso que às vezes, logo em seguida, ela começa a se justificar geralmente para deixar claro de que se trata de uma profissão temporária. Não que eu esteja defendendo a personagem, também acho desnecessário esse tipo de exposição. Mas acontece que algumas têm orgulho da profissão e acho que dependendo das condições, é um sentimento louvável.
Ah, gosto muito da forma como você escreve!
Beijinhos!
PS: Eu sou puta
Olá, que ótimo que haja debate de idéias aqui.
ResponderExcluirClaro que permito, e além de permitir, agradeço.
A idéia de escrever um post às vezes não consegue passar na totalidade aquilo que estamos pensando naquele momento.
Nesse caso, só me estranhou a forma direta, não a mim como disse, mas junto às outras pessoas presentes.
Talvez, o exercício da sinceridade crie um elo com a exposição, e num mundo paradoxo em que vivemos, se expor é realmente o nosso limite.
Mas quem sou eu pra reclamar? Se meu rosto está aqui, de alguma forma sou como ela, e quem sabe eu também tenha feito uma auto-crítica.
Muito obrigado por participar e opinar.
Passei no seu blog. É ótimo e vou voltar mais vezes.
Beijo Grande
ACM