terça-feira, 6 de abril de 2010

Como Um Americano em Paris


Mais perdido que cachorro em dia de mudança, me sentindo um americano em Paris.
Já faz um tempão, aproximadamente no final de década de oitenta. Eu, um garoto sonhador fetichista sedento de encontrar eco do outro lado da gruta, cheguei a São Paulo por meras razões comerciais e aceitei um convite para uma festa, afinal havia outros compromissos no dia seguinte que me obrigava a pernoitar por lá.
Festa de gente comportada, tudo no lugar. Copos e pratinhos usados não ficavam cinco minutos sem serem retirados. Nada melhor a fazer do que encher o pote do bom whisky que havia por lá.
Se havia três ou quatro convidados que eu conhecesse era muito e àquela altura estava doido pra tomar o rumo do hotel, ligar a TV até o sono chegar. Mas como sempre existe uma surpresa, apareceu uma garota chamada Márcia, uma loira esbelta de cerca de um metro e setenta totalmente fora do padrão estabelecido pelos anfitriões.
A mulher falava mais alto, queria dançar, estava alegre demais e o ambiente não combinava com ela. E depois de tentar de todas as formas dar um pouco de vida ao recinto, veio parar sentada num sofá ao meu lado. Dava pra notar seu descontentamento.
Mas de repente ela entrou na conversa, que pra falar a verdade, nem me lembro muito bem, pois já estava em outro lugar pensando na vida. Então passei a prestar a atenção ao que rolava a minha volta e notei que ela fazia perguntas diretas às pessoas a tal ponto de causar certo constrangimento aos que estavam por ali.
Me peguei gostando da situação e dando risadas da desenvoltura da garota.
Até que ela notou a minha humilde existência e resolveu ser direta na pergunta: “o que você mais gosta de fazer?”.
Sem titubear respondi direto: “sexo”.
Claro que meu teor alcoólico foi responsável direto pela pronta resposta que causou mais embaraço em quem estava por perto. Mas quem não gosta? O problema é falar, ainda mais em público, e pra piorar onde ninguém sabe quem você é, apenas um convidado de um convidado.
Como não me senti avermelhado ou me achando pagando mico, encarei de frente e me preparei para continuar no pequeno “talk show” que a menina transloucada havia criado naquela sala. Ela tentou de tudo, cavou por todos os lados enquanto eu escapava com respostas evasivas que só criavam confusão e polemica, até que a metralhadora da loira apontou em outras direções.
A roda aumentou e outros participantes entraram em cena. É aquela velha história: quando um boceja todo mundo abre a boca...

Como eu já contava algumas participações em discussões do fórum da revista “Ele e Ela” joguei o fetiche na conversa, fiz valer a minha opinião e algum conhecimento. Alguns devem ter me achado um chato, um maluco beleza ou me taxaram de bêbado, mas o importante foi olhar nos olhos de pessoas indiferentes ao meu mundo e falar abertamente do assunto sem importar com o que eles pensariam a meu respeito.
Penso que comecei a escrever minha história fetichista naquela noite no Jardim Paulista. Daquele dia em diante comprei a briga e pude me olhar no espelho sem medo ou censura.
Talvez houvesse chegado a hora, ou a ajuda do whisky tenha sido fundamental, mas a Márcia foi meu maior incentivo e produziu o efeito desejado: foram duas noites maravilhosas em São Paulo de puro fetiche e algumas outras aqui no Rio de Janeiro.
A vida seguiu seu curso e a Márcia desapareceu em silêncio deixando essa lembrança gostosa de uma noite que passado tanto tempo não dá pra esquecer.

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